domingo, outubro 28, 2007

In Memorian

Um dia você vai morrer!
É claro que você sabe disso!

Mas eu não estou falando da morte fisiológica, afinal nem a ciência consegue definir quando você realmente morre!

Estou falando da morte real, aquela que vai acontecer a nós meros mortais. Aquela que vai aconter quando a última pessoa que conviveu com você ou soube da sua existência, morrer.

Quando seu neto ou bisneto morrer.

Essa é a morte inexorável e definitiva. A morte que não veio pra Mozart, Einstein Ou Mahatma Ghandi. A morte dos mortais que não se destacaram.

Essa foto aí é do meu avô. Ele morreu em outubro de 1990. Parece que foi ontem, mas já se foram 17 anos. Meu deus do céu, como estou velho!

Deus! É engraçado um ateu clamar por Deus. É que eu acho que ser ateu é como ser gay, não é escolha, é sina. Nada contra os homossexuais, apenas digo que não há escolha.

E uma das piores coisas de ser ateu é justamente não creditar em vida eterna e imortalidade da alma. Não é questão de querer ver, porque fé é assim: ou se tem ou não se tem.

É claro que se todo mundo visse ou falasse com Deus como nos contos bíblicos a coisa seria bem mais fácil. mas aí perderia a graça.

Bom, mas aproveitando, eu estou apresentando a vocês o meu avô. O nome dela era Ornildo (não riam) Era chamado de "Coroné Ornildo" pelos mais chegados. E ele não tinha nem uma fazenda.
Ele casou com minha avó no método antigo, chegou gostou, disse que queria casar e casou... Dizem que passou três dias dormindo na rede até conseguir alguma coisa...
Ele teve duas filhas, Eliene, minha tia e Eula (não riam, por favor), minha mãe.
Era um excelente negociante... Tinha uma quitanda e trabalhava com caminhões. Ele tinha alguns.
Ele contava que uma vez comprou um caminhão de cebola e metade estragou, quando ele foi jogar a metade ruim fora achou um diamente no meio das cebolas, deu pra comprar outro caminhão só com o lucro. Quando eu era pequeno eu acreditava nessa história.
Depois de um tempo ele passou a negociar carros. Tinha época que ele tinha mais de 20 carros. "Aprendi" a dirigir em alguns deles. Depois de um tempo ele comprou uma oficina de lanternagem (funilaria como se dizia lá em Presidente Dutra). Aí ele comprava o carro caindo aos pedaços por uma mixaria, ajeitava a lataria do bicho, dava umas guaribadas na lata velha e vendia como seminovo. O velho era esperto.
Ele também gostava de armas. Um tempo ele tinha uma 12 de cano serrado.
Nesse tempo eu tava no clube dos jovens lá em Presidente Dutra quando teve uma briga do lado de fora, quando notei lá vinha ele com a 12 na mão. "Vambora!", "pra quê essa arma?", perguntei, no que ele respondeu. "Estou sem óculos e tá escuro, se alguém se metesse comigo era mais fácil de acertar um tiro!" O vé era dureza.
Os amigos diziam que ele desmontava um trinta e oito e montava de novo, deixando o bicho melhor. Uma vez ele me levou pra fazer uma cobrança. Quando chegamos lá ele me disse:
"Fica aqui, se alguma coisa acontecer tem um trinta e oito carregado no porta luvas". O que eu, um menino de 12 anos ia fazer com um trinta e oito é que eu não sei.
Uma vez, em toda a vida dele ele me deu um presente. Na verdade ele me dava vários presentes, só que ele só pagava o que minha avó comprava pra gente, desde roupas, calçados, alguns brinquedos e as entradas pro Clube dos Jovens (só a entrada, se dançasse muito passava o resto da noite com sede). Mas eu tava falando do presente. Eu tava na casa dele quando ele chegou com uma camisa dentro do plástico, aqueles plásticos de camisa, e jogou em cima da mesa. "Pra ti!" e entrou em casa sem nem olhar pra trás. Era uma camisa social amarela que anos depois eu doei ao Abrigo São Lucas.
Bom se você chegou até aqui então minha missão foi cumprida. Você é mais um a manter meu avô vivo, nem que seja só na sua memória ou imaginação. Por via das dúvidas, antes de fechar a página e continuar seu trabalho e sua caminhada rumo à morte, dá só mais uma espiada no retratro dele...
Ah. Esse blog pode me ajudar a me perpetuar um pouco. pelo menos até eles desativarem a conta e apagarem essa página do servidor.